Neste
artigo discutimos:
Primeira Mulher “curada” do HIV após
novo tratamento;
Quem são os outros três pacientes “curados”
da infecção pelo HIV?
Paciente Berlim, Paciente Londres e
Paciente Dusseldorf;
Será que existem
pessoas que conseguiram eliminar o vírus HIV de forma natural?
O transplante de medula-óssea será o tratamento definitivo contra o
vírus HIV?
Uma mulher dos EUA entrou para o pequeno grupo de pessoas
possivelmente curadas do HIV. Com ela, já são quatro pessoas sem sinais do
vírus HIV após diversos testes.
A mulher parou o tratamento antirretroviral em outubro
de 2020, após realizar um transplante de células-tronco. Até aí, nada demais.
No entanto, foram utilizadas nesse transplante células com deficiência no
receptor CCR5, o responsável por mediar a entrada do vírus HIV nas nossas
células. Na ausência do CCR5, o vírus
não consegue infectar os nossos linfócitos T CD4. Pessoas com mutações naturais
no gene CCR5 apresentam resistência à infecção pelo HIV.
Mutação do gene CCR5 mostrando a incapacidade do HIV de se
ligar na célula.
Fonte: aqui
Por que foi realizado o transplante de
células-tronco?
A mulher,
que também tinha leucemia, recebeu o transplante para tratar esse tipo de câncer.
Então, como ela precisava passar pelo transplante para tratar o câncer, aproveitou-se
para realizar o procedimento com células que apresentavam mutações no gene do
receptor CCR5.
De forma bem resumida, este é o histórico clínico da paciente:
Mulher
afro-americana com diagnóstico de infecção pelo HIV em junho de 2013 e que
iniciou o tratamento antirretroviral logo em seguida. Antes do tratamento,
apresentava uma carga viral de 1.000.000 copias/ml. Após iniciar o tratamento,
em novembro de 2013, foi realizado novo exame laboratorial e observou redução
significativa na carga viral, < 20 copias/ml. – Vejam o quanto evoluímos no
tratamento contra o HIV, hoje conseguimos controlar bem a carga viral e o
portador do vírus consegue ter uma vida praticamente normal -. Em março de
2017, ela foi diagnosticada com Leucemia Mieloide Aguda (LMA) – tipo de câncer
que afeta a medula óssea.
Como
foi o tratamento?
Por
conta da quimioterapia, as células sanguíneas foram destruídas e a paciente tornou-se
elegível para o transplante. Em agosto de 2017, ela recebeu transplante de células-tronco
do cordão umbilical que tinha mutações no receptor CCR5. No entanto, as células
do cordão umbilical demoram algumas semanas para “pegar”, começarem a se multiplicar
e formarem novas populações de células sanguíneas. Lembrando que as nossas
células de defesa fazem parte da população celular do sangue. Neste
intervalo entre o transplante pegar e as células se multiplicarem, a paciente
fica totalmente susceptível às infecções, já que suas células de defesa estão praticamente
zeradas!!! Para impedir essa suscetibilidade, a paciente também recebeu doação de
células da medula-óssea de um familiar. Essas células do familiar agiram
como uma ponte, replicando mais cedo e fortalecendo o sistema imunológico. Depois,
essas células são naturalmente substituídas pelas células-tronco do cordão
umbilical (ver imagem abaixo).
O tratamento
antirretroviral foi interrompido 37 meses após o transplante. Mais de 14 meses
depois da interrupção, não foi detectado NENHUM sinal do vírus HIV nos
testes e nem anticorpos contra o vírus!
Esquema sobre o tratamento.
Imagem traduzida por Mellanie Fontes-Dutra e
Diego Tanajura
E os outros 3 pacientes “curados”?
Além dessa paciente, três
outros com câncer tiveram remissão do HIV após o transplante com células-tronco,
que continham células com mutação no gene CCR5.
A primeira pessoa a ser
curada da infecção pelo HIV foi Timothy Ray Brown, chamado de “paciente
Berlim”. Ele recebeu o transplante de células-tronco com mutação no gene
CCR5 para tratar o câncer. Em 2019, outros dois pacientes também foram curados,
um homem em Londres (“paciente Londres”) e outro em Dusseldorf, na Alemanha (“paciente Dusseldorf”).
Timothy Ray Brown faleceu em 2020
por conta da recidiva da leucemia. Recomendo a leitura do texto que ele
escreveu fazendo uma reflexão pessoal sobre a sua luta.
Esses 4 casos aqui relatados, de possíveis curas do HIV, aconteceram com intervenção da ciência. Será que existem pessoas que conseguiram eliminar o vírus HIV de forma natural? Só com a ação do seu sistema imunológico?
Sim, existem! Dois casos já
foram relatados por pesquisadores, o primeiro foi nos EUA e o segundo na
Argentina. Ambos os casos foram em mulheres que conseguiram eliminar o vírus do
corpo somente através do seu próprio sistema imunológico, sem o uso de drogas antirretrovirais.
O transplante de medula-óssea
será o tratamento definitivo contra o vírus HIV?
Muita
calma nessa hora! Realmente, esses quatro relatos de pacientes com HIV
possivelmente curados da infecção são feitos notórios da ciência! No entanto, o
transplante de células-tronco só foi realizado porque esses pacientes desenvolveram
câncer.
O transplante,
seja de medula óssea ou do cordão umbilical, é algo arriscado, custoso e não é
uma opção de tratamento para pacientes infectados com HIV, além daqueles que
precisam desse artifício para tratar doenças como câncer. Por outro lado, todo
o conhecimento gerado nesses tratamentos é importante para a ciência buscar formas
mais seguras, baratas e exequíveis em larga escala para o tratamento e a cura das
pessoas portadoras do vírus HIV.
Mensagem
final
Para
finalizar, vou utilizar um trecho do editorial publicado na revista científica “The Lancet”: “A mensagem para os formadores de políticas, financiadores, mídia e
público é clara – o HIV não é uma infecção curável para qualquer um, mas para
um número pequeno de pessoas em circunstâncias excepcionais. A busca por
uma cura escalável continua e deve ser bem financiada, mas enquanto a busca
continua, o investimento em medidas comprovadas de tratamento e prevenção é
mais importante do que nunca”.
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