Resolução aqui.
João nasceu após uma gravidez sem intercorrências, pesando
3,1 Kg. Os seus primeiros 6 meses de vida foram praticamente normais. Aos 7 e 11
meses foi internado com pneumonia por Haemophilus influenzae. Depois dos
12 meses, teve 4 episódios de otite média e erisipela. Todas essas infecções responderam
prontamente aos antibióticos apropriados. No entanto, sua mãe, uma enfermeira, notou
que seu filho estava em constante uso de antibióticos.
Sua mãe teve dois irmãos que morreram por pneumonia aos dois
anos de idade. Ela também tem duas irmãs saudáveis.
Numa consulta aos 2 anos, foi constatada uma criança pálida e
magra, com altura e peso abaixo do percentil ideal. Não havia outras
características anormais. Ele havia sido imunizado* com as vacinas: pentavalente (Diftéria, Tétano, Coqueluche, Meningite
por Hib e hepatite B); Meningo C; Poliomielite (Salk). Além disso,
ele havia recebido vacina contra sarampo, caxumba e rubéola. Todas as
imunizações ocorreram sem intercorrências.
Por conta das suas infecções recorrentes, foi solicitada uma
investigação imunológica. Os resultados mostraram redução acentuada em todas as
3 classes de imunoglobulinas do soro e nenhuma produção específica de anticorpos
(ver tabela).
A citometria de fluxo mostrou que 85% os linfócitos se
ligaram ao anticorpo anti-CD3, um marcador de célula T (resultado normal); 55%
foram classificados como linfócitos T CD4 (marcação com anticorpos anti-CD4) (resultado
normal) e 29% como T CD8 (marcação com anticorpos anti-CD8) (resultado normal).
No entanto, nenhum linfócito do sangue periférico teve marcação com anticorpos
anti-CD19 (normal 12%), um marcador de células B.
A ausência de linfócitos B maduros no sangue periférico sugere
uma falha na diferenciação de células B, que somada à história familiar sugere
fortemente o diagnóstico de agamaglobulinemia ligada ao X.
O diagnóstico de agamaglobulinemia foi fechado através da
detecção de mutação no gene Btk. A deficiência de anticorpos foi tratada através
da aplicação intravenosa de imunoglobulina humana (IgG), 2x na semana.
Ao logo dos anos, a sua saúde melhorou constantemente, peso e
altura estão normais, e ele só teve um episódio de otite média nos últimos 4
anos. Ele agora tem 12 anos e pode se tratar com imunoglobulina de reposição subcutânea em casa.
*Observem que não foi falado da vacina BCG. Por ser um caso
clínico traduzido e adaptado de dois livros: um livro americano e outro britânico,
a vacina não é obrigatória
nestes países.
Figura 1. Análise
de citometria de fluxo de um indivíduo normal (esquerda) e de João, paciente
com agamaglobulinemia ligada ao X, (direita). Os linfócitos do sangue de um
indivíduo normal se ligam ao marcador de células B (anticorpo anti-CD19) e
marcador de células T (anticorpo anti-CD3). No entanto, os linfócitos do sangue
de João, apenas se ligam ao marcador de linfócitos T (anticorpo anti-CD3). Isso
indica a ausência de células B nesse paciente.
O caso
abordado acima foi traduzido e adaptado de dois relatos de casos obtidos das
seguintes referências:
1) Essentials of Clinical Immunology, Includes Wiley E-Text, 6th Edition;
2) Case Studies in Immunology: A Clinical Companion.
Perguntas:
1) Por que João estava bem nos primeiros 6 meses de vida, sem nenhuma infecção? Como você explicaria isso?
2) Pacientes com alguma imunodeficiência não devem tomar vacinas de microrganismos atenuados. Vários meninos com agamaglobulinemia ligada ao X que receberam a vacina da pólio atenuada, desenvolveram paralisia infantil. Qual a sequência de eventos levou ao desenvolvimento da pólio nesses meninos?
3) As infecções recorrentes em João foram por infecções bacterianas por Streptococcus e Haemophilus. Essas bactérias possuem uma fina capsula composta de polissacarídeos, que as protegem do ataque direto por fagócitos. Os humanos produzem anticorpos IgG2 contra esse polissacarídeo. O anticorpo IgG2 “opsoniza” a bactéria, facilitando a fagocitose por células fagocíticas. Qual outro defeito genético no sistema imune poderia clinicamente mimetizar a agamaglobulinemia ligada ao x (focar no ponto da opsonização)? Quais são as classes e subclasses de anticorpos humanos?
4) Qual a explicação para as infecções virais e por bactérias intracelulares serem incomuns em crianças com agamaglubolinemia ligada ao x?
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