Em
1950, o virologista australiano Macfarlane Burnet estabeleceu o conceito de imunovigilância,
que afirma a estreita relação existente entre o sistema imunológico e os
tumores, tanto no que tange à eliminação de células anômalas antes delas se
transformarem em tumores propriamente ditos, bem como na eliminação de células tumorais
já existentes. Posteriormente, esse conceito foi validado pela observação do
surgimento de mais casos de cânceres em pacientes imunossuprimidos.
Isso mostra que o sistema
imune está vigilante, e quando acontece algo que suprimi a resposta imune,
observa-se o aumento no risco em desenvolver câncer.
Para uma melhor compreensão deste artigo, recomendamos a leitura deste outro texto – Entendendo os linfócitos naive, efetores e de memória.
Neste artigo, fundamentado no conceito de Burnet, vamos discorrer sobre a importância dos linfócitos T citotóxicos (CTL) na eliminação desses tumores.
Quando
associamos imunidade à supressão tumoral, imediatamente devemos lembrar dos
CTLs CD8+, visto que é esse subtipo de linfócitos T que utiliza o killing
como sendo a principal maneira de se defender contra tumores. Os CTLs conseguem
êxito na sua função de imunovigilância, justamente pela sua capacidade em reconhecer
e destruir células que expressam peptídeos derivados de antígenos tumorais
associados às moléculas do MHC de classe I, que foi comprovado pelo seu
desempenho positivo em estudos in vivo envolvendo animais acometidos por
tumores gerados por carcinógenos e por vírus de DNA.
Além
disso, os CTLs tumor-específico ainda podem ser isolados em seres humanos com
tumores estabelecidos, o que aumenta a possibilidade do desenvolvimento de
medidas terapêuticas eficazes no tratamento de certos cânceres. Porém, ainda
vale ressaltar a incapacidade de detectar CTLs tumor-específicos funcionais
em alguns pacientes, devido à presença dos mecanismos reguladores
empregados pelo próprio tumor para suprimir as respostas de CTL.
Isso quer dizer que é
possível não detectar a presença de CTLs funcionais no microambiente tumoral,
pois o câncer acaba agindo para suprimir esse tipo de resposta e, assim, poder
“sobreviver”.
Pode-se comparar o câncer
com um microrganismo que tenta lutar, fugir da resposta imune para poder
sobreviver.
Mas como ocorre a resposta dos linfócitos T CD8+
aos tumores?
A
maioria das células tumorais não é derivada das APCs (células apresentadoras de
antígenos), então, elas não estão presentes nos órgãos linfoides secundários
(Linfonodos, por exemplo); além disso, a maioria das células tumorais não
expressa os coestimuladores necessários para iniciar as respostas de célula T
ou as moléculas do MHC de classe II necessárias à estimulação de células T
auxiliares (linfócitos T CD4) promotoras de diferenciação de células T CD8+ (pretendemos fazer
um post para explicar esse mecanismo).
O
que melhor explicaria essa resposta é a possibilidade das células tumorais, ou
pelo menos seus antígenos, serem ingeridos pelas APCs, especificamente, pelas
células dendríticas, que por sua vez fazem o processamento dos peptídeos
tumorais, que são ligados e expostos na membrana celular, associados às
moléculas de MHC de classe I para o reconhecimento das CTLs CD8+. Todo esse
processo nós chamamos de apresentação cruzada, ou, simplesmente, cross-priming
(pretendemos fazer um post para explicar esse mecanismo).
As
células dendríticas transportam os antígenos tumorais para os linfonodos e se
colocalizam com as células T naive, como é ilustrado na figura 1. Ademais,
as APCs e as células T auxiliares são ativadas ao mesmo tempo, fornecendo os
sinais necessários à diferenciação das células TCD8+ naive em CTLs
tumor-específicos. Uma vez gerados, os CTLs efetores são capazes de
reconhecer e matar as células tumorais em qualquer tecido, sem nenhum
requerimento de coestimulação.
Figura 1: Resposta
de linfócitos T citotóxicos (CTL) contra tumores. Abbas (2019).
As células TCD8+ contam com a ajuda das células
TCD4+.
Os efeitos antitumorais das células Th1 podem
refletir seu papel comprovado na intensificação das respostas da célula T CD8+
e na ativação de macrófagos, via secreção de fator de necrose tumoral (TNF) e
interferon-γ (IFN-γ), já que é o segundo quem pode aumentar a expressão do MHC
de classe I na célula tumoral, bem como a sensibilidade à lise pelos CTLs. A
relevância do IFN-γ na imunidade tumoral é demonstrada pelo aumento do
surgimento de tumores em camundongos knockout desprovidos dessa
citocina, de seu receptor ou de moléculas sinalizadoras induzidas pelo IFN-γ.
Referência:
ABBAS, A.K; LICHTMAN, A.H; PILLAI, S. Imunologia
celular e molecular. Elsevier, 9 ed. 2019.
Texto: Matheus Vinícius Cardoso Santos
Revisão técnica: Diego Moura Tanajura